Flores (se fosse possível) invisíveis
De modo a evitar equívocos, tudo o que vou contar a seguir, não é pura imaginação, mas também não se passou comigo, como de costume, foi com um amigo, com um amigo sempre conveniente, sempre à mão-de-semear, quando queremos contar alguma coisa mais comprometedora, para nós, ou para alguém nosso conhecido.
Então, há alguns anos, estava esse meu amigo no seu trabalho, sentadinho à sua secretária, do outro lado da sala, noutra secretária, estava a sua colega de gabinete e, era a paz total, o chefe e o patrão, possivelmente ainda entretidos à mesa, no almoço, estavam, por enquanto, ausentes, portanto, patrão fora, dia santo na loja, ou seja, a trabalhar, deviam estar, esses dois, mas numa velocidade “cruzeiro”, sem pressas.
Com pressa, veio, esse sim, o estafeta, aquele que lhes apareceu à frente, carregado com um enorme ramo de flores. Feita a entrega, num estalar de dedos, desapareceu. Não, o ramo, não era para o meu amigo, nem para a sua colega, era para o chefe deles. A colega, espreitou o cartãozinho e, viu, era de, já que estamos em maré de amigos, uma “amiga”. O referido ramo de flores, talvez por uma questão de espaço, ficou a aguardar a entrega, ao destinatário final, junto à secretária do meu amigo.
Finalmente, patrão e chefe, bem-dispostos, chegaram. O meu amigo nem deixou o chefe respirar, num pulo, foi até junto deles, de ramo na mão e, possivelmente, com ar presenteiro, ao mesmo tempo que estendia o ramo na direcção do chefe, disse:
- São para si!
- Para si!?
Exclamou, interrogou, logo, o patrão.
O chefe deu uma olhadela ao cartão e, meio embaraçado, ficou de ramo na mão, sem saber bem o que fazer naquele momento.
Notando o embaraço, o patrão, picado, pelos olhares cúmplices, do meu amigo e da sua colega, sem rodeios:
- Quem lhe enviou isso X?
- Foi, foi, um amigo.
Respondeu, sem pensar, o chefe, de pronto.
- Um amigo!!!
Abriu a boca, de espanto, sem acreditar naquilo que acabara de ouvir, o patrão.
Naquele dia era o dia dos namorados e, da esposa do chefe, a proveniência do ramo, era certo, não tinha sido.
Foi pior a emenda que o soneto.
O lindo ramo, ao final do dia, por mero acaso, ficou esquecido, ali, no escritório.